domingo, 20 de março de 2011

Volta

Dos olhos dele se diz que são azuis, eu prefiro pensá-los violeta, pois é a cor que tomam nos meus sonhos. Das mãos pálidas, se diz que são pesadas; eu as imagino cálidas e espero que sejam afáveis. Antes eu soubesse ao certo que som têm as falas que dele. Fosse a voz dele tenor, talvez fossem musicais. Se me falasse algum dia, provável que pra perguntar-me as horas, eu divagaria em ilusões e nunca lhe responderia as horas.

Nos sonhos ele me aparece sempre, às vezes de olhos cor de jacintos ou de misótis. Eu espero que seu perfume seja doce, doce como todo um jardim: um que tenha flores vibrantes, de aspecto calmo e de cores brilhantes. Que resplandeça entre o verde da relva, o azul do céu e o fulgor amarelo do sol. Fosse ele amável, de toque gentil e olhos da cor que quisesse, contanto que eles olhassem pra mim. Penso que filosofia é o que mantem vivas as rosas entremeadas ao meu portão de ferro que parece renda, lá fora. É claro que sem as palavras para nomeá-las e elogiá-las, as rosas acabariam enfraquecendo-se e por fim murchariam, caindo mortas ao chão. Não fosse pelos adjetivos que as deleitam e aos filósofos que as admiram, com certeza não existiriam essas célebres flores; fazer um jardim requer trabalho e dedicação, cuidar de rosas então, é mais custoso ainda. Pergunto-me se haveriam rosas escalando meu portão de ferro branco, coroadas de orvalho e frescas pelo viço do sol e da chuva se não houvessem filósofos para filosofá-las. Acho que o quero dizer é: assim como para as rosas existem os filósofos, para ele eu existo, ou assim eu gosto de pensar. 

Dá uma provável causa para a minha existência por vezes incerta. É só pensamento desejoso, no fundo eu sei. Mas é que preciso de alguma responsabilidade, alguma participação qualquer que seja. Por que a verdade é que se eu não o amasse, ou sobre ele escrevesse, pensasse e dele falasse, ele continuaria a viver sem saber que eu vivo também. Ou melhor, continuaria do mesmo jeito que era antes, e eu ficava com todo o peso da mudança. É porque nós humanos insistimos em gostar de quem não nos quer tão bem quanto os queremos. Clássico caso de amor não-correspondido. Eu tenho certeza que se traçasse todo um plano, conseguiria que ele me notasse, mas no fundo, no fundo, é quase como se gostasse das coisas como estão. Sofrer não é tão bom assim, eu sei, mas então como se explica o por quê de eu tanto gostar?

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