segunda-feira, 16 de maio de 2011

Carta

Querido sempre-pensado,

Eu estava na ponta do deck. Vendo os arcos das pontes por onde passavam os navios e barcos, percebi que as luzes dos postes que delineavam a ponte refletiam-se na água escura, assim criavam-se faixas longas como que se adentrassem o lago e ficassem como feixes que um teto translúcido deixou passar.

A minha surpresa foi que, quando chegou a brisa à noitinha, trazendo lembranças das jardins floridos à beira-lago, e encrespou as águas do lago escuro com a Lua no fundo, as tiras de luz amarela refletidas no lago frisaram que nem fitinhas no vento calmo.

Como me veio alegria, Caio, de pensar em você dizendo que as curvas da cidade são por causa dos reflexos ondulados das luzes da cidade no lago. Que o museu é branco por que lembra metade da Lua, que os postes são enormes pra compensar os prédios baixos e imitar as palmeiras, que no parque a arena dá impressão de terraços quando se olha ao outro lado e se vê as plantas pendentes e verdes contra o cinza do concreto, tudo isso, notei pra ter o que te contar, mas sei que você já sabia.

Ali, no parque, os postes altos são flores, por que as luzes, viradas pra baixo, onde seriam as pétalas, abrem-se em coroas de três.

Pensando nessa carta, lá no deck, olhando o lago, fumava um cigarro em que batia com o dedo pro vento calmo levar as cinzas. Uma delas, pertinho dos meus olhos, tilintou como uma borboleta; se fossem dessa cor as borboletas, eu teria lhe contado que foi uma, não chega a ser mentira. Podia ser meia-verdade poética.

Estamos tão íntimos que já lhe sou honesto em meus desejos. Pois lhe contarei um, não por demais secreto, só pra começar em princípios. Instaurar um hábito saudável, que é a intimidade, começando lá na frente, não dá certo, eu acho. Por isso inicio com um desejo leve. Eu sempre quis andar de lancha. E você? Me conta um desejo seu, depois nos falamos, primo. Até a resposta. Seu amigo.

 


 

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